Uma série de maravilhosas demonstrações sobre o universo (1676)

(Catena Mirabilium Demonstratiorum De Summa Rerum)
G.W. Leibniz
A nº85 – 12 de dezembro de 1676

Nada é e não é ao mesmo tempo; ou algo é ou não é.3 Algo que é feito agora, diz respeito a coisas presentes. Mas, encarregar-se agora de algo que é ou passado ou futuro seria o mesmo que estar presente; mas nada é ao mesmo tempo presente e passado, por isso o que está feito não pode ser desfeito, nem algo deixa de ser futuro exceto quando se torna presente.

Não há nada sem uma causa, já que não há nada sem todos os requisitos para que exista. O efeito total é equivalente à causa plena, já que deve haver alguma igualdade entre causa e efeito, que passa de uma para outra. Mas isso consiste nessa equivalência, nem pode uma outra perspectiva ser excogitada. Há apenas um tipo de mundo, ou, não há entidades além dos corpos e mentes, isto é, o que sentimos, nem há quaisquer corpos exceto aqueles que estão a uma certa distância de nós. Pois se houvesse alguns, não se poderia dizer se agora existem ou não existem, o que é contrário ao primeiro princípio. Então, segue-se que nem todos os possíveis existem.

Que o espaço e o tempo são infinitos exige uma demonstração completa. Afirmar que há um tempo sem coisas é nada afirmar, porque a quantidade daquele tempo não pode ser determinada por qualquer sinal. Desde que a causa é equivalente ao efeito, não em perfeição mas em expressão, o encadeamento das criaturas não pode ter começado em algum tempo, mas antes houve sempre algo além de Deus, ou, Deus sempre criou algo. “Meu pai ainda não cessou seu trabalho”. Há uma grande diferença entre um tempo e uma linha. Um intervalo entre dois estados momentâneos, entre o que nada pôde interpor-se, não pode ser determinado de maneira alguma, nem pode ele ser dito como muitas coisas podem estar interpostas; pois por que deveria haver mais? Esse não é o caso do espaço, se por exemplo, um globo está vazio interiormente. Então, aquelas coisas que estão no tempo e entre as quais nada está interferindo, tocam-se. Esse não é o caso do espaço, devido à posição.

Que o espaço é infinito também é provado disto: que qualquer tamanho que seja assumido, não há por que não possa ser feito maior. Mas é evidente que nenhuma razão pode ser dada, já que há no espaço a maior homogeneidade, e sua existência não impede outras coisas. Que alguma coisa era para ser feita é evidente do fato de que alguma coisa foi feita e já que não há razão que determine ou limite seu tamanho, será ela tanto maior quanto possa ser, ou, absolutamente infinita.

O mesmo argumento também prova que não há vácuo, quer intercalado, quer grande, já que é possível para todas as coisas serem preenchidas. Pode-se também dar, de uma outra fonte, uma refutação especial de um grande espaço ultramundano, que é infinito e no qual há um mundo finito; pois essa matéria seria nele dispersa e nunca mais tornaria a ser unida. Admitindo-se a plenitude, os átomos estão demonstrados. Eles também são provados sem a plenitude, da simples consideração do fato de que tudo que é flexível é dividido em pontos.

Parece muito mais em acordo com a razão que corpos primitivos fossem todos esféricos, mas que suas direções sejam todas retilíneas. Corpos coesos originam-se do fato de que, se certos corpos são colocados juntos em um arco que está oco, isto é, cheio de uma matéria mais sutil, esse arco é quebrado com dificuldade porque os poros que são deixados por seus componentes são muito pequenos para serem penetrados pela matéria circundante, de tal forma como a preencher o espaço. Esses corpos estáveis podem ser reduzidos a uma forma globular de quase qualquer tamanho, porque deste modo eles obstruem os corpos circundantes tão pouco quanto possível e porque isso pode ser realizado sem serem quebrados. Assim, todas as coisas vêm das esferas e mesmo se as esferas não fossem os elementos fundamentais, ainda haveria sempre um retorno a elas; assim, uma variedade de formas nos átomos seria inútil e, deste modo, é suficiente para todos os átomos serem esféricos.

A melhor prova de que um corpo difere do espaço ou extensão é derivada disso: que não se pode, da extensão unicamente, ou, da noção de comprimento, largura e altura, demonstrar a impenetrabilidade, isto é, demonstrar que duas coisas extensas não podem estar no mesmo lugar, ou, que é impossível para dois sólidos extensos serem congruentes um com o outro, isto é, serem sólidos cujos pontos, dado um deles, não guardam distância de algum ponto do outro.

Notas:
1. Summa Rerum parece significar, aqui, “a soma das coisas”, isto é, o universo, em vez de “ser supremo”;
2. Título atribuído por Leibniz;
3. Uma afirmação dos princípios da contradição e do terceiro excluído.