G. W. Leibniz
(1676)
Couturat, L., Opuscules et fragments inédits de Leibniz. Extrait des manuscrits de la Bibliothèque royale de Hanovre (Paris, 1903; reimp., Hildesheim, 1961) 183
Aqueles dois primeiros princípios, o da razão: o que é idêntico é verdadeiro e o que implica contradição é falso, e o da experiência: uma diversidade é percebida por mim, são tais que permitem demonstrar, primeiro, que é impossível prová-los; segundo, que todas as outras proposições dependem deles. Ou seja, se esses dois princípios não forem verdadeiros, absolutamente não existe nenhuma verdade nem conhecimento. Assim, é necessário aceitá-los sem hesitação ou renunciar completamente a toda investigação da verdade. Ademais, não se pode apresentar nenhum motivo de dúvida contra esses princípios que, por sua vez, não afete todas as outras proposições.
Lembro-me de que um homem talentoso (o bispo de Thina) queria atribuir toda evidência à autoridade. Eu lhe objetava que um homem solitário também pode ter ciência. Ele, por outro lado, argumentava assim: as proposições que se provam, ou seja, que se tornam evidentes, são provadas a partir de proposições evidentes ou não evidentes. Se forem provadas a partir de proposições não evidentes, não poderão tornar-se evidentes a partir delas. Mas, se forem provadas a partir de proposições já evidentes, o problema surgirá novamente sobre essas últimas e assim até o infinito, de modo que não haverá nenhuma evidência, ou algumas serão evidentes por si mesmas. Mas como saberemos que essas proposições, que certamente todos aceitam, são evidentes por si mesmas senão pelo consenso dos homens?
Respondo que são evidentes por si aquelas proposições cuja supressão implica a supressão da verdade. Além disso, eu lhe apontava que poderia demonstrar algumas proposições sem assumir mais do que as concedidas. Por exemplo, se alguém sustenta uma opinião que quero mostrar absurda, assumirei, nesse caso, proposições que ele tenha concedido e, a partir delas, concluirei legitimamente a proposição contraditória de alguma que ele mesmo afirmou. Disso se segue que uma das proposições que ele assumiu é falsa, ou seja, que não podem ser simultaneamente verdadeiras. Daí também fica claro que o absurdo só pode ser demonstrado a partir daquela proposição que envolve mais afirmações ou concessões, isto é, que conclui o absurdo argumentando com base nas proposições concedidas. Por isso, toda demonstração é, na verdade, uma dedução ao absurdo. E a demonstração não exige nenhuma assunção, ou seja, princípios diretos, mas apenas reflexos. Assim, desaparece a dificuldade que atormenta todos sobre como temos certeza daqueles princípios dos quais se extraem as demonstrações. Deve-se dizer que as demonstrações não procedem de nenhuma afirmação, mas das proposições concedidas, ou seja, das hipóteses, e a única coisa a fazer é mostrar que algumas hipóteses se contradizem entre si. Consequentemente, assumo apenas os princípios reflexos, ou seja, indiretos ou formais, primeiro porque a forma silogística é válida; em segundo lugar, porque a contradição é absurda. Mas não aplico outros princípios materiais ou de conteúdo na demonstração, apenas aquelas hipóteses do adversário cuja falsidade demonstro. Por isso, de certo modo, toda demonstração é ad hominem.
Por outro lado, concedo que todos os homens se guiam, em muitos casos particulares, pela autoridade (veja-se o livrinho de Santo Agostinho sobre a autoridade de crer) e que, frequentemente, a opinião comum é o recurso decisivo de nossos juízos práticos. No entanto, estou certo de que quem meditar cuidadosamente encontrará princípios mais elevados para guiar seu julgamento.