(Quos Ens Perfectissimum Sit Possibile)
G. W. Leibniz
Novembro (?) de 1676
Ao que parece, descobri uma demonstração de que o Ser mais perfeito ou aquele que contém toda essência, ou que possui todas as qualidades, ou todos os atributos afirmativos – é possível, ou, não implica uma contradição.
Isso será evidente se eu mostrar [ostendero] que todos os atributos (positivos) são compatíveis entre si. Mas, os atributos são ou analisáveis ou não-analisáveis; se são analisáveis, serão agregados daqueles nos quais são analisados. Logo, será suficiente ter demonstrado a compatibilidade de todos os atributos primários ou não-analisáveis, ou, daqueles que são concebidos per se. Porque, se os atributos individuais são compatíveis, também são muitos, e, por isso, são atributos compostos. Será, portanto, suficiente demonstrar apenas a inteligibilidade de um Ser que contém todos os atributos primários, ou, demonstrar que quaisquer dois atributos primários são compatíveis entre si. Sejam esses atributos A e B. Se são incompatíveis, então a proposição “A qualidade A e a qualidade B não podem estar no mesmo sujeito” será necessária e, portanto, será ou uma proposição idêntica ou uma que é demonstrável. I) não pode ser uma proposição idêntica; porque, então, “Quando A é, B não pode ser” seria o mesmo que “A é A” ou “A é B” e, portanto, uma expressaria a exclusão da outra, e, assim, uma delas seria a negação da outra. Mas isso é contrário à hipótese, porquanto assumimos que todos os atributos são afirmativos; II) não é demonstrável; porque se fosse demonstrar-se, “quando A é, B não pode ser”, isto somente seria feito pela análise de um ou outro termo, ou de ambos. Isso é contrário à hipótese; porque as havíamos assumido como não-analisáveis. Logo, essa incompatibilidade não pode ser demonstrada. Portanto, não há incompatibilidade, e, então, quaisquer duas qualidades afirmativas são compatíveis e todas são compatíveis com todas. Logo, um Ser que possui todos os atributos é possível.
Ademais, parece que disto se pode provar que um Ser deste tipo, que é o mais perfeito, é necessário; porque não pode existir a menos que possua uma razão para existir, ou de si mesmo ou de outro. Mas não pode possuir essa razão de um outro, pois tudo que pode ser entendido em algo mais já pode ser entendido no mais perfeito Ser mesmo, quer porque o concebemos per se, quer porque não possui Ele nenhum requisito fora de si. Logo, ou ele pode não possuir razão para existir, e então é impossível, o que é contrário ao que havíamos demonstrado, ou ele terá uma razão para existir dele mesmo, e então será necessário. Todo atributo simplesmente afirmativo é infinito; ou é tão máximo quanto pode ser, ou contém todas as coisas que pertencem ao seu gênero. Há, necessariamente, muitos atributos afirmativos primários; pois se houvesse apenas um, apenas uma coisa seria compreendida. Parece que afecções negativas podem surgir apenas de uma pluralidade de atributos afirmativos – por exemplo, pensamento e extensão. Pois como é impossível para algo extenso ser pensado sem variedade, segue-se que certos modos de extensão são necessários, e que todos aqueles que foram, são, ou serão, podem ser pensados por um ser. Disto a origem e necessidade da modificação é evidente.
Pode ser facilmente demonstrado que todas as coisas são distinguidas, não como substâncias (isto é, radicalmente), mas como modos. Isso pode ser demonstrado do fato que, daquelas coisas que são radicalmente distintas, uma pode ser perfeitamente compreendida sem uma outra; isto é, todos os requisitos de uma podem ser compreendidos sem todos os requisitos de um outro serem compreendidos. Mas, no caso das coisas, isso não é assim; pois, já que a razão última das coisas é única e contém em si mesma o conjunto de todos os requisitos de todas as coisas, é evidente que os requisitos de todas as coisas são os mesmos. Então, também são as suas essências, dado que uma essência é o conjunto de todos os requisitos primários. Portanto, a essência de todas as coisas é a mesma, e as coisas diferem unicamente pelos modos tal como uma cidade vista de um ponto elevado difere daquela vista do plano. Se ao menos essas coisas são realmente diferentes que possam ser separadas, ou, de que uma possa ser entendida perfeitamente sem a outra, segue-se que nenhuma coisa realmente difere de uma outra, mas que todas as coisas são uma, exatamente como Platão argumenta no Parmênides.
A razão última de todas as coisas é a mesma. Uma razão última é o conjunto de requisitos suficientes. O conjunto de requisitos suficientes é a essência. Portanto, a essência de todas as coisas é a mesma. Requisitos parecem indicar a relação com a existência, os atributos com a essência. Atributo, afecção, propriedade, essência. Um atributo é um predicado que é concebido [concipitur] por si mesmo, ou, é não-analisável. Uma afecção é um predicado que é composto por atributos. Uma propriedade é uma afecção que contém todos os atributos. Uma essência é …
Uma metafísica deve ser escrita com definições e demonstrações precisas, mas nada deve ser nela demonstrado além daquilo que, demasiadamente, não discorde das opiniões acolhidas [receptis]. De tal sorte, certamente, esta metafísica pode ser acolhida; e uma vez que tenha sido aprovada, então, se outros a examinarem mais profundamente, extrairão por si próprios as necessárias conseqüências. Além disso, pode-se, como um empreendimento separado, mostrar a essas pessoas, posteriormente, o modo de raciocinar sobre essas coisas. Nessa metafísica, será útil adicionar-se, aqui e ali, declarações abalizadas de grandes homens que raciocinaram de modo semelhante; especialmente quando essas declarações contêm algo que parece possuir alguma relevância possível para o esclarecimento da opinião.
Um “atributo” é um predicado necessário que é concebido per se, ou, que não pode ser analisado [resolvi] em vários outros.
Uma “afecção” é um predicado necessário que pode ser analisado em atributos, ou, uma afecção é um predicado que pode ser demonstrado de um sujeito.Uma “propriedade” é uma afecção recíproca, ou, uma afecção que contém todos os atributos de um sujeito, ou, do qual todos os seus outros predicados podem ser demonstrados.
Uma “essência” é tudo que é concebido em uma coisa per se, isto é, o agregado de todos os atributos.
Um “acidente de uma coisa” é um predicado contingente.