Primeira carta de Leibniz a Clarke (1715)

Primeira carta de Leibniz a Clarke (Nov. 1715) [1]

1. Parece-me que a religião natural está excessivamente enfraquecida [na Inglaterra]. Muitos julgam as almas [humanas] corporais; outros, que o próprio Deus é corporal.
2. O senhor Locke e seus seguidores duvidam, ao menos, se as almas não são materiais e naturalmente perecíveis.
3. Sir Isaac Newton afirma que o espaço é um órgão pelo qual Deus sente as coisas. Mas se Ele necessita de algum meio para as sentir, disto se segue que elas não dependem inteiramente d’Ele e não são Sua produção.
4. Sir Isaac Newton e seus seguidores também possuem opinião singular sobre a obra de Deus. De acordo com eles, Deus necessita, de tempos em tempos, dar corda em seu relógio, pois do contrário ele deixaria de funcionar. Ele não teve a suficiente presciência para dar-lhe um movimento perpétuo. Esta máquina de Deus é até tão imperfeita, segundo eles, que Ele se vê obrigado a poli-la de tempos em tempos por um concurso extraordinário, e mesmo consertá-la, tal qual um relojoeiro faz com sua obra, o qual será tanto pior profissional quanto mais vezes se vir obrigado a retocar e corrigir seu trabalho. Na minha opinião, [o mundo sempre contém] a mesma quantidade de força e de energia, que apenas passa de uma coisa material a outra, conforme as leis da natureza e a bela ordem pré-estabelecida. E sustento que Deus, ao operar milagres, assim o faz não para satisfazer as necessidades da natureza, mas sim as da graça. Qualquer um que pense diferentemente deve ter uma muito indigna noção da sabedoria e do poder de Deus.

Notas:
[1]. Excertos de carta de Leibniz a Sua Alteza Real Princesa de Gales.